terça-feira, 8 de janeiro de 2008

Vamos abrir os nossos álbuns: Ester e Nilo

Como um bom álbum de família, neste também a goma arábica secou em algumas contoneiras as fotos foram se encaixando em novas páginas sem nenhuma ordem cronológica. A única ordem é a originada na emoção de ver e rever com os olhos do coração tanta gente querida.


Ester e Nilo, "naquele" carnaval


Alegria é o que não falta!

O riso diz tudo!

Mariana, Raquel, Maringá e Savana, filhas da Glória, netas de Ester e Nilo.

Atrás: Isabelle e Felipe, filhas da Milda; Lucas Maná, filho da Concita.
Na frente: Marianne e Brunheld, filhas da Dodora, com Júlia Tainá, filha da Concita, no meio.

Brunheld, filha da Dodora e Felipe, filha da Milda

Patrícia, filha da Dedê, Paulo e os filhos Antônio e Francisco

Brunheld e Dodora

Michelângelo, filha da Dodora


Sebastião e Dodora


Patrícia e Francisco


Concita e Bernard

Glória e Tancredo Filho


Mariana, Raquel e Maringá, filhas da Glória


Júlia Tainá, filha da Concita


Nilo, Maria e o Velho Tancredo, na praia da Base


Everaldo, filha da Zilma, e Marcelo, filha da Dedê

Lucas e Luiza, filhos da Maria Esther, netos da Dedê

Dedê Maia, filha de Ester e Nilo

Thor, filho da Concita, tomando tacacá, no Quinari/AC



Dedê e Francisco Pinhãta, dos Ashaninka


Ester

Ester, doutor Thor e Concita


Ester, Velho Tancredo, Careca. Mário e Zilma


Velho Tancredo, Careca, Mario e Ester, comemorando 65 anos de quem?

Dodora, ao centro, e Concita, à esquerda




































































































































































quarta-feira, 2 de janeiro de 2008

Yasmim nasceu

Nasceu hoje, dia 2 de janeiro de 2008, ás 18h15, em Brasília-DF, a Yasmim, o mais novo galhinho desta Trupe Maia Pega-pinto.

Yasmim é filha da Januária e do Júlio, neta da Olívia Maria e a 22º bisneta de Tancredo e Maria e irmã da Marina, do Lucas, do Gabriel e da Júlia e é o 568º registro na árvore genealógica da Trupe Maia Pega-pinto.

Seja bem-vinda, Yasmim, e que você alcance as sete paz (leiam a postagem Novo Ano Novo) e seja muito feliz.

terça-feira, 1 de janeiro de 2008

Aniversário da Edjane

No dia 1º de janeiro de 1977, nasceu Edjane Maia dos Santos, filha de Laura Maria e Bené, neto de Velho Tancredo e Maria, irmão do André, Janine e Diogo.
Casado com o Emerson, tem dois filhos: Lucas e Arthur.

Para Edjane, tudo de bom neste duplo Ano Novo.

Edjane com Primavera, filha do Milton José, o Digú.

Edjane com o filho Arthur



Novo Ano Novo

O povo Aymara vive, a séculos, às margens do lago Titicaca, de águas plácidas e cujos por-do-sol, de uma beleza deslumbrante, o Paulo Queiroz Maia fotografou antes de se mudar para Gatineau.



Paulo, em Gatineau /Canadá

Lago Titicaca (foto: Paulo Queiroz Maia)

No século XI, o imperador Aiamepurt recebeu a notícia que o fim dos tempos estava chegando e que ele precisava preparar o seu povo para este dia. Depois de ouvir o Conselho dos Anciãos e de muitos estudos e consultas aos livros sagrados o imperador decidiu fazer um pedido ao seu povo. Sim, pedir, pois diferente de outros imperadores e governantes de antanho e atuais, o imperador Aiamepurt não ordenava; ele pedia e o povo só realizava se achasse justo o pedido.

O imperador anunciou que a única forma de evitar o fim dos tempos era construir um grande sino de prata, que nessa época era abundante e ainda não tinha sido saqueada pelos invasores espanhóis, e que no dia anunciado como o do fim dos tempos todos deveriam se reunir na Praça Maior e badalar (naqueles tempos esta palavra só queria dizer bater o sino) o grande sino com devoção e disciplina, como procura fazer as suas ações a Moema do Prado Pereira Maia.

Moema


Assim foi feito.

A fé foi tão grande e o som daquele sino foi tão bonito que o que seria o fim dos tempos foi apenas o fim de um dia e o fim de mais um ano.

Naquela noite o imperador aproveitou para pedir a seu povo que buscasse, sempre, os sete diferentes tipos de paz.

O Tadeu e o Samuel e o Tomás Maia e todos nós também devemos buscar estes sete diferentes tipos de paz.

Tadeu, Samuel e Tomás

O primeiro para dentro de si. Consigo próprio, na saúde do corpo, na lucidez da mente, no prazer da vida, na correspondência de seus amores. Sem paz consigo, não se está em paz.

A segunda é para cima. Com os espíritos dos antepassados, com a vontade suprema. Se não se está em paz com o mundo sobrenatural, com a metafísica da existência, a paz fica incompleta.

A terceira é para frente, com o seu passado, como sabe desde remotos tempos o povo Aymara. Com remorsos, culpas dívidas – principalmente as morais – não pagas, arrependimentos – inclusive do que não fez – não se está em paz.

A quarta paz é para trás, com o futuro. Quem tem medo do que virá, está assustado com dívidas a pagar, com o emprego incerto, esperando más notícias, não está em paz.

A quinta é para o lado esquerdo, com seus próximos. Sem a paz familiar não há paz. A disputa doméstica, o descontentamento com familiares, tira o sentimento de paz.

O sexto é para o lado direito, com seus vizinhos. Não adianta a paz em casa se, do outro lado da rua, estão a ameaça, a maldição, o descontentamento.

A última paz para baixo, com a terra em que se pisa, de onde virá o nosso sustento. Se vier tempestade, se o solo secar ou tremer, não haverá paz.

Somente assim a paz será completa.

Muitos e muitos anos depois daquele primeiro dia de um Ano Novo o poeta Carlos Drummond de Andrade, que nasceu no dia 31 de outubro, mesmo dia do aniversário da Maria Queiroz Maia, escreveu:

Maria

“O último dia do ano
Não é o último dos tempos
Outros dias virão.”

segunda-feira, 31 de dezembro de 2007

Aniversário do Oiram

Escrito por Olívia Maria, tia do Oiram:


"Quando li a última noticia do blog fui tomada de uma certa estranheza. Lá dizia: Ufa! Em fim chegamos ao último aniversariante do mês, gerados no fuc-fuscs, nheco-nhecos...

Êpa ficou alguém pra trás, pensei . Hi! e o meu (nosso) querido “Ô” onde está? Bateu uma saudade permeando todo meu Ser. As lembranças daquele menino travesso que ficava atrás das portas de minha casa com a Marina, minha filha, morrendo de rir e fazendo coro quando eu cantava “A todo mundo eu dou psiu, psiu, psiu!!! perguntando por meu bem (e eles respondiam Psiuuuuuu, fazendo caras e bocas!)”, varreu-me a mente e o coração.

O menino que ria fácil e dançava difícil. Pois é, sinto muitas saudades do Oiram. Tenho um profundo carinho e muita admiração por ele. Bateu asas e foi voar em outros ares... Barcelona/Espanha... mas está sempre em minhas lembranças e no meu coração.

Nossa! só percebi agora que comecei de trás pra frente – faltou a apresentação para os que não o conhecem: Oiram, nasceu em 15 de dezembro de 1974, filho do Mário César e Anita, neto de Tancredo e Maria e irmão do Alberto, Atina, Dani e Mário Junior, tio da Lua Clara e Pilar. Prá você, “Ô” muito querido, beijos muitos, afagos vários, e votos de 2008 cheio de realizações, saúde e muuuuuuuiitas alegrias."

Oiram , à direita, com seu irmão Alberto, aprontando no Carnaval







Oiram, "pedalando" em Berlim

sexta-feira, 28 de dezembro de 2007

Aniversário do Mário Augusto

Ufa, chegamos no último aniversariante do mês de dezembro. Aqueles fuc-fucs e nheco-nhecos renderam bons frutos que tê se desdobrados e galhos e galhinhos desta imensa árvore Trupe Maia Pega-pinto.
Em 28 de zembroi de 1956, em Rio Branco/AC, nasceu o Mário Augusto Maia de Queiroz, filho da Zilma e Antônio Júlio. É pai do Júlia, da Lia, da Iara e da Ludmilla e avô coruja do Mário José e Ana Júlia. Nosso mais afetuoso abraço e votos de muitas alegrias neste Ano Novo.


Eliana e Mario Augusto

Mario Augusto e Tancredo

Mario Augusto e Dedê

Mario Augusto, em julho de 2006







terça-feira, 25 de dezembro de 2007

Aniversário da Nayara

No dia 25 de dezembro de 1987 nasceu a Nayara, filha da Iaramara, neta do Tancremildo e Rosa.
Além da beleza (Alexandre, cadê a foto recente?), da meiguice e da voz maravilhosa, a Nayara tem uma particularidade que a distingue: é a primeira bisneta do Tancredo e Maria, assim como a Iaramara foi a primeira neta dos dois.
Para a Nayara tudo de bom, com muita paz e muito amor no coração.



Nayara e Velho Tancredo, em 2001







sexta-feira, 21 de dezembro de 2007

Quem sou eu? Dedê Maia - última parte

A última parte do depoimento da querida Dedê, com grandes revelações:

"Em 1973, o casamento com o pai dos meus filhos foi desfeito depois de algumas idas e vindas, com amarras que pareciam nunca mais se soltar. (me desculpem, mas esse é um capítulo doloroso, com muitos espinhos, eu vou pular). Desse tempo apenas registro o meu fascínio e minha adoção ao movimento\filosofia “ripe”, levantando a bandeira “paz e amor”.

Em fim, retornei para Rio Branco.

Nesse retorno, por ironia do destino, fui morar em um bairro chamado Floresta. Poucas casas e a maioria dos moradores eram “colonheiros” (famílias que moravam em pequenas extensões de terra denominadas de colônias). Eram antigos seringueiros que migraram dos seringais em decadência, decorrência da expansão da frente agropecuária que começou a se instalar no Acre com toda a sua força no início da década de 1970 e passaram a sobreviver de uma pequena criação de animais domésticos e agricultura de subsistência dentro dessas colônias.

Os encontros com esses vizinhos de conversas amistosas, relatos recheados de lembranças dos seringais a luz da lamparina que ardia às narinas fizeram com que ressurgisse meu interesse em retomar a trajetória do “magistério político” interrompido com meu casamento e com o golpe militar em 1964.

A alguns membros dessas famílias comecei a ministrar aulas a noite. As aulas eram gratuitas, mas compensadoras em vê-los felizes ao descobrirem os códigos da escrita e da leitura. Creio que a paixão pelo magistério foi influência de minha mãe, dedicada professora de grande parte dos acreanos em diferentes décadas. E o “magistério político” foi uma conseqüência de minha formação “Paolofreireana”.

Foi nesse tempo que encontrei o antropólogo Txai Terri Valle de Aquino (pai do Lucas Mana). Foi paixão a primeira vista. Nem tanto pela sua figura física. Estatura mediana, quase raquítica, como todo bom nordestino e acreano de coração e alma. No entanto, logo conquistou um grande número de admiradores (e seguidores) pelo seu estudo e trabalho em defesa dos povos da floresta. Eu fui uma delas.

Dele ouvi os relatos de suas andanças pela floresta, dos povos que ali habitam e suas histórias marcadas a ferro e a fogo como gado. Esse encontro redespertou a consciência de minha história e de minhas raízes também indígenas como todo o povo acreano. Naquele momento da minha vida foi uma luz no final do túnel!

Foi assim que em 1977, após morar três anos em Brasília onde fui tentar dar continuidade aos meus estudos, a convite do Txai Terri e de minha irmã Concita (na época casada com Txai Terri) ajudei a pensar e a implantar a primeira escola indígena letrada entre os Kaxinawá do rio Humaitá, município de Tarauacá. E lá fui eu, empurrando canoa, recheada de ansiedade, receios, mas também determinação e muitos sonhos. Um deles era contribuir para uma vida mais digna e humana entre os povos da floresta. Estou escrevendo essa história, tendo como referência meus diários de campo desse tempo e breve publicarei com o título “Viagens pelos Rios do Interior”. Aguardem!

Durante o retorno dos Kaxinawá, povo que se autodenomina de Huni Kui, (Gente Verdadeira) início de 1979, eu, Concita e vários outros companheiros fundamos a Comissão Pró Índio do Acre na qual trabalho até os dias de hoje como assessora do programa de educação - “Uma Experiência de Autoria” e coordenadora do Centro de Documentação de Pesquisa Indígena dessa referida entidade. Porém esse ciclo está sendo fechado. Serei Pró Índio eternamente e em qualquer lugar, pois não é algo institucionalizado dentro de mim e sim habita a minha consciência e o meu coração. Pretendo ainda realizar alguns trabalhos através do governo do Acre, do qual sou funcionária desde 1988, lotada na Fundação Cultural e em seguida pensar na minha merecida aposentadoria. Tenho outros sonhos a serem realizados ainda nessa passagem terrena. Espero poder realizá-los.

Esse trabalho pela nossa floresta de jóias foi de muitos aprendizados e me proporcionou viajar e conhecer os rios do interior (nos dois sentidos); encontrar meu amor “primor de flor” depois de dois casamentos frustrados. Pensei que fosse para toda a vida. Depois aprendi que “para toda a vida” não significa “para sempre” nessa vida terrena. Ficou para sempre no coração. Como um passarinho bateu asas e voou. À distância aprecio os seus vôos e torço pela suas conquistas e vitórias.

Essas andanças também me permitiram mergulhar nos mistérios e nas forças dos altares do ritual do Nixi Pae, Camarãmbi, Huni, Ayuaska (os ocidentais chamam de Santo Daime), aprendizados que fortaleceram mais ainda o meu respeito pelos povos da floresta; pela vida espiritual; pelos meus laços familiares. Ainda revitalizaram o meu fascínio pelas artes e pelas histórias dos encantados quando mergulhei nas pesquisas sobre a arte do kene do Povo Huni Kui. Kene na língua desse povo significa desenho, escrita. São padrões gráficos encontrados em suas pinturas corporais, nas cerâmicas, na tecelagem em palha e algodão. Segundo uma das histórias de origem foi Yube, um Huni Kui encantado na cobra Jibóia quem deu esses conhecimentos para eles. Essa pesquisa além de ter me alimentado com conhecimentos vários, me incentivou ainda a brincar com o barro e criar miniaturas em argila e me lambuzar de tinta pintando algumas telinhas. Preciso levar esse trabalho mais a sério, como diz minha irmã Concita. Eu chego lá!

Esse convívio com os povos da floresta ainda fortaleceu em mim o valor de se ter amigos; o respeito pelos inimigos; a reverência pela a mãe natureza; o olhar o mundo com os olhos do coração; ensinaram-me que a chuva só cai no seu tempo certo; que a paciência e a perseverança são as chaves da realização. Isso tudo lapidado aos pouquinhos, perseverando sempre, pois os cancros enraizados pelas vivências infelizes e equivocadas ao longo da vida são profundos.

Eu sou esse ser, porém cheia de defeitos vários ainda. Contudo procurando e perseverando em superá-los, ou pelo menos entendê-los a fim de minimizar as conseqüências. Sou um ser que ainda embala alguns sonhos; que gosta da sua solidão (sem ser solitária); que ainda se encanta com o entardecer e o amanhecer do dia; adora os passarinhos; conversa com as plantas; que se emociona com cada flor que brota em seu jardim; que acredita em Deus; acredita que essa vida aqui é uma passagem; que viemos de um mundo espiritual e para lá iremos retornar; que se preocupa em entender a sua missão aqui nesse planeta Terra e fazer o melhor que puder. Sou um ser descrente dos políticos (já fui militante do PT em sua formação); sou a favor da democracia leal e transparente; sou pelo amor; sou pela paz!

Posso dizer que sou um ser feliz, ao lado dos meus filhos, dos meus netos que são “doces” que se somam aos “doces” de minha infância e que ajudam a adoçar a minha “velhice”. Sou feliz por ter tantos entes queridos e por fazer parte dessa trupe Maia Pega Pinto da qual muito me orgulha em pertencer.

Agradeço a Deus, todos os dias, por tudo isso!

quinta-feira, 20 de dezembro de 2007

Chuva, lago, peixe e escola

Texto especial de Maria Maia, a Mariazinha, em homenagem aos 85 anos do Careca, também conhecido como Milton Maia:

"Inverno amazônico. A chuva cai a tarde toda. Estou no Cabuletê e minha alma se molha como as árvores que meu pai plantou durante 30 anos lá fora: as castanheiras - uma delas será sacrificada pois cresce demais e está na passagem e se o ouriço cair lá de cima pode matar um. Mas tem outra lá atrás. E tem seringueira, cumaru-de-cheiro, mogno, cedro, imbaúba, samaúma, dendê, jatobá, abil, cajá, cupuaçu, copaíba, faveira, côco, coquinho ouricori, tucumã, pupunha, buriti, carambola, graviola, manga, ata, acerola, açai, abacaba, marupá, ixória, helicônia, viuvinha, lírio, acácia, orquídea bambu, antúrio, azaléia, flamboyant, cacto, maria-sem-vergonha, catinga da mulata, begônia, maravilha, manacá, alpinha, alamanda, cheiro-verde, rúcula, tomate, capeba, jambu, gengibre, taioba, cará, erva cidreira, manjericão, chicória, salsa, alecrim, açafrão, boldo, alfavaca, capim-santo, hortelã, menta, pimenta...chá, chá, chá. Meu pai criou no Cabuletê um pulmão verde para compensar o seu, consumido pelo enfisema que o cigarro lhe deixou. Com este pulmão resistiu 30 anos, até morrer aos 83.



Vista do Cabuletê


Taioba da folha branca, no banheiro do Cabuletê
Ah! o velho Careca. Quase analfabeto, teve de deixar a escola aos 10 anos para trabalhar na coleta de castanha. Filho do velho Benedito que ganhou o apelido de Pega-pinto graças ao refresco que fazia com a raiz de... pega-pinto. Jura minha mãe que o pega-pinto é mais que um remédio: limpa o sangue. Nesses tempos de coca-cola zero e água adicionada de sais seria muito bom provar o velho refrigerante que o vô Benedito vendia no Tentamem.
Não conheci meu avô. Morreu cego, ditando poemas pros filhos copiarem. Não devia ditar pro meu pai, coitado, pois este sofria do grave defeito de ser canhoto, pecado jamais perdoado pelos mestres da escola onde ia com um pé calçado e o outro descalço, tingido de urucum. Precisava dividir o sapato com o irmão que usava do mesmo estratagema. É, o Benedito poeta e vendedor de refresco de pega-pinto não tinha mesmo dinheiro pra comprar os sapatos todos dos meninos e o grupo escolar não perdoava. Só entrava calçado. Então o jeito era fazer de conta que o outro pé estava machucado. Acho que veio daí o hábito de meu pai de usar a imaginação. Era um contador de história nato. Mais. Era um criador de história. A do bebê, encontrado chorando na porta do cemitério - o Benedito morava com os filhos ao lado do cemitério - quando ele voltava de uma festa arrepiava meus cabelos de menina, quando ia dormir. Pois ele resolveu levar o tal bebê ao mercado, naquela madrugada de friagem cortante, na esperança de encontrar uma alma caridosa que ficasse com o menino. Colocou então a criança morta de frio debaixo do capote e seguiu. No meio do caminho ele resolveu abrir o capote pois o menino começou a pesar. Pois não é que o danado já não era mais bebê, mas o próprio capiroto e arreganhou os dentes, num sorriso de vampiro? O Careca, abandonou imediatamente o coisa ruim e saiu em desabalada carreira. Ao se aproximar da catedral viu na esquina uma pessoa. Pensou, ufa! finalmente, uma alma viva! E lá se foi contar a história do menino desamparado que pesou no capote e arreganhou os dentões enormes de vampiro danado. Pois o homem virou-se para meu pai e abrindo um sorriso falou: e não serão estes dentes aqui, não? Pena que o Careca não pode continuar na escola. Pois além dos sapatos o grupo escolar exigia que os alunos fossem destros. Canhoto tinha que passar a aula toda com o joelho no milho ou com a mão esquerda para cima, como numa saudação hitlerista. Além de receber palmatória até que abandonasse o perigoso "vício" de escrever com a mão esquerda. Resultado, o Careca fugiu da escola e o Benedito não reclamou, já que ele ajudava em casa carregando latas de castanha nas costas. Careca cresceu fora da escola, mas virou sábio. E casou com a Raimunda, filha de soldado da borracha aqui chegada em 44, aos 11 anos.
Raimunda e Careca
Tia Raimunda
Ela também não pode ir pra escola por muito tempo. Os 6 filhos foram chegando um em cima do outro e Raimunda não tinha tempo de estudar pois além dos filhos ele ajudava o Careca na Casa do Pão, hoje belíssimamente reconstruída lá no novo Mercado Velho. Mas de pão em pão o Careca e a Raimunda deram formação universitária para todos os 6 filhos. Eu mesma, estudei um bocado, mas não consegui alcançar a sabedoria do velho Careca. Foi um ecologista antes do tempo. Além de plantar pra respirar, distribuia mudas por toda a cidade. Foram mais de 200 mil, ao todo, desde que criou a Reflorestadora Silvestre, batizada poeticamente com o Silvestre que Raimunda carregava quando solteira. Aqui no Cabuletê não deixava matar bicho algum.
Nem caranguejeira nem cobra.
Cobra, com 3 metros, da criação do Careca no Cabuletê
Caranguejeira, da criação do Cabuletê, que nos visitou no dia
do aniversário da Matriarca Zilma, em 29 de julho de 2006
Antes da estrada passar, pois há sempre uma estrada que passa para atrapalhar, tinha um açude onde criava tambaquis, pirarucu, jacaré, tilápias, carpa, curimatã, pacu e o que mais pudesse, só pelo prazer de distrubuir com os amigos e com quem mais viesse. Certo dia foi com meu irmão comprar uns alevinos pro açude. Ao invés do habitual milheiro que comprava todo ano, resolveu comprar 5 milheiros. Meu irmão estranhou, Mas pai, pra que tanto peixe? Não se incomoda, toca lá pro Amapá.
Tancredo Filho, Careca e Mariazinha, no Açude do Braga
E lá foram, os peixes, meu irmão e o Careca pro lago do Amapá. Lá chegando o Careca pegou os alevinos e jogou no lago. Diante do olhar espantado do meu irmão, falou: este lago deu muito o que comer pra minha família quando eu era menino. Agora tô devolvendo um pouco. E como era um pacificador nato, me disse um dia: dou graças ao meu mestre que me tirou da escola e me colocou a lata de castanha nas costas. Me ensinou a trabalhar bem cedo. É, o Careca não teve muito estudo mas, em matéria de sabedoria, desbanca muito doutorzinho por aí.
Alan Kardec e Careca, na praia da Base

As quatro estrelas do Oriente, segundo vô Benedito, em Cruzeiro do Sul, em 1953

Tancredo, Alan Kardec, Milton e Mário

(fotos do álbum de Tancredo Maia Filho)